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Índice
1. Introdução
A dinâmica do processo de descentralização territorial é orientada pelo princípio do “gradualismo” que encontra a sua aplicação tanto ao nível do processo de criação das autarquias locais , O “gradualismo” na criação das autarquias locais , As razões da escolha do gradualismo , ) Os critérios do gradualismo, As modalidades das transferências de competências.
2. A DINÂMICA GRADUAL “DO PODER LOCAL”
A dinâmica do processo de descentralização territorial é orientada pelo princípio do “gradualismo” que encontra a sua aplicação tanto ao nível do processo de criação das autarquias locais (A) como ao nível da transferência das competências do Estado para autarquias locais (B).
2.1. O “gradualismo” na criação das autarquias locais
Se em alguns países, todo o território nacional encontra-se dividido em “territórios autárquicos”, isto não é, ainda, o caso de Moçambique. Com efeito, o processo de “municipalização” do país, inicialmente, tomou em conta apenas 33 autarquias locais (1997) , e muito recentemente, acrescentaram-se 10 outras autarquias locais (200882) o que faz com que o país conte, hoje, com 43 autarquias locais . O preâmbulo da Lei n.º 10/97, de 31 de Maio esclarece as razões objectivas desta escolha (a) e a lei fixa os critérios (b).
2.1.1. a) As razões da escolha do gradualismo
As razões da escolha do gradualismo estão directamente ligadas à existência de condições mínimas para poder gozar efectivamente da autonomia administrativa, financeira e patrimonial. A reunião destas condições caracteriza o que foi baptizado de “princípio do gradualismo”. Assim, a escolha do princípio do gradualismo explica-se por razões directamente ligadas à existência ou a suficiência de condições económicas e sociais necessárias e indispensáveis para o bom funcionamento da administração autárquica e isto, de forma sustentável. Contudo, alguns autores criticaram o “princípio do gradualismo” defendendo que “O princípio do gradualismo estabelecido pelo legislador limita sem dúvida a afirmação, o desenvolvimento do princípio constitucional do poder local, limita a participação de todos os cidadãos na promoção democrática do desenvolvimento da sua comunidade, bem como priva os cidadãos de terem as mesmas oportunidades de aprofundamento e consolidação da democracia, através da participação nas eleições autárquicas”.
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2.2. b) Os critérios do gradualismo
Inicialmente (1997), foram escolhidas, como autarquias locais, a capital do país e as 10 capitais provinciais às quais associaram-se 22 autarquias de média importância. O critério de escolhas destas últimas autarquias integrava dois aspectos. O primeiro é geográfico (1 autarquia por província); outro é o resultado da aplicação dos critérios estabelecidos pela lei. O Artigo 5 fala sobre a nalcionalidade:
1. A nacionalidade moçambicana pode ser originária ou adquirida.
2. Os requisitos de atribuição, aquisição, perda e reaquisição da nacionalidade
são determinados pela Constituição e regulados por lei. da Lei n.º 2/97, de 18 de Fevereiro estabelece os critérios para a criação de autarquias locais. Nesta perspectiva, o Parlamento deve tomar em conta:
· Os factores geográficos, demográficos, económicos, sociais, culturais e administrativos;
· Os interesses de ordem nacional ou local em causa;
· As razões de ordem histórica e cultural;
· A avaliação da capacidade financeira para a prossecução das atribuições que lhes estiverem
· cometidas.
Assim, a lógica do gradualismo fundamenta-se em factores objectivos. O factor geográfico tem a ver com a localização das vilas propostas, uma em cada província; o factor demográfico tem como indicador o número dos cidadãos eleitores apurados em 1994; o factor económico é caracterizado pela actual capacidade de realização de actividades económicas (produção e comercialização) dos sectores familiar e empresarial; os factores social e cultural são caracterizados pela actual capacidade financeira avaliada e representada pelo grau de dependência de cada vila em relação a subsídios do Estado ao respectivo orçamento. Além dos factores legais já referidos, há a considerar a capacidade actual das infra-estruturas para instalação dos serviços e habitação da Administração Pública em cada vila e o facto de a administração das vilas encontrar-se totalmente integrada na Administração do Distrito.
Assim, o Artigo 5 da Lei n.º 2/97, de 18 de Fevereiro, estabelece uma espécie de "autovinculação limitada". Com efeito, o Legislador impõe-se, previamente o respeito de determinadas regras que têm um conteúdo objectivo no âmbito da criação, extinção e modificação das autarquias locais. É, de alguma forma, uma garantia no que diz respeito à criação de uma autarquia local. Com efeito, a partir do momento em que os requisitos relativos à criação da autarquia local são reunidos será difícil ao órgão competente para criar uma nova autarquia local fundamentar uma recusa da sua criação. É, também, uma garantia no que diz respeito à extinção de uma autarquia local existente. Com efeito, o órgão competente para extinguir deverá, pelo menos, verificar que as condições enumeradas no Artigo 5 da referida lei, que existia na altura da criação da autarquia local, não se encontram reunidas num determinado momento que é susceptível de permanecer. Em certa medida, existe uma competência vinculada por parte da Assembleia da República na apreciação de alguns elementos de facto na sua decisão de criar, extinguir ou modificar as autarquias locais.
Isto quer dizer que a partir do momento em que o Parlamento inicia um processo de criação, extinção ou modificação das autarquias locais, ele é obrigado – deve - conforme nos termos do n.º 2 do Artigo 5 da Lei n.º 2/97, de 18 de Fevereiro - a tomar em conta os requisitos básicos estabelecidos por esta disposição. Mas esta competência vinculada é limitada pelo facto de que a tomada em conta desses factores não exclui outros factores. Por outras palavras, trata-se de uma vinculação mínima. Na apreciação das iniciativas que visem a criação, extinção e modificação das autarquias locais, a Assembleia da República poderá, além desses elementos, considerar outros para a tomada da sua decisão. Todavia, a garantia legislativa é apenas "legislativa". Isto quer dizer que a Constituição não consagra esses factores como constitucionais. O legislador pode, em qualquer momento, voltar a modificar esses requisitos básicos. Mas o processo de municipalização gradual, pelo facto de ser "gradual", implica que ele seja extenso nas restantes vilas, logo que os factores de decisão previstos na lei estejam reunidos ou, por outras palavras, logo que as condições para a instalação da administração autárquica viável e sustentável estejam maduras. Alguns autores questionaram este processo porque este vem de cima para baixo: “Porque não dar maior relevo à vontade popular dentro dos marcos constitucionais?” e deixar a maior ou menor vontade dos cidadãos determinar o ritmo da descentralização?
B. O “gradualismo” no processo de transferência das competências Cabe ao Governo criar as condições para as transferências das competências exercidas por órgãos locais do Estado para as autarquias locais. Esta transferência deve operar-se de “forma gradual” e acompanhar-se, por um lado, da formação técnica dos agentes autárquicos e, por outro lado, da consolidação dos necessários requisitos financeiros dos órgãos autárquicos (Artigo 84 da Lei n.º 1/2008, de 16 de Janeiro). É o Decreto n.º 33/2006, de 30 de Agosto que regula as modalidades da transferência de competências (b) e institucionaliza, de facto, uma verdadeira transferência “à escolha” (a).
3. a) Uma transferência “à escolha”
O legislador, a partir de 1997, tinha estabelecido o princípio de que a transferência de competências dos órgãos do Estado para os órgãos das autarquias locais devia ser acompanhada pela transferência de recursos financeiros e, se necessário, humanos e patrimoniais (Artigo 25 da Lei n.º 2/97, de 18 de Fevereiro).
As autarquias locais e as estruturas locais das organizações sociais e da administração directa e indirecta do Estado coordenam os respectivos projectos e programas e articulam as suas acções e actividades com vista à realização harmoniosa das respectivas atribuições. 2.
A Administração Central do Estado aprova, sempre que necessário, regras de cooperação técnica e financeira com as autarquias locais para a prossecução de políticas e programas de desenvolvimento local e para a implementação de políticas globais e sectoriais e/ou que impliquem a reconversão de sectores sociais e económicos. (BR, Lei n.° 6/2018 sexta feira, 3 de agosto de 2018. Pp. 44)
As dificuldades financeiras com as quais se debatia o Governo (mais de 50% do orçamento do Estado é alimentado pelos parceiros internacionais ao desenvolvimento), e, talvez, também, a ausência de uma real vontade política de promover o processo de transferência de competências (fenómeno bem conhecido do “conservatismo administrativo”), tinham feito com que o legislador, por um lado, não tivesse optado por uma transferência de “blocos de competências”, e que o Governo, por outro lado, não tivesse adoptado uma verdadeira política na matéria. É apenas em 2008 que o legislador moçambicano deu um certo impulso ao processo de transferência de competências, consagrando os princípios directores que deviam orientar este processo. Em primeiro lugar, o Governo é encarregue criar as condições para a implementação do processo de transferência (responsabilidade política).
Em segundo lugar, o legislador afirma a forma gradual deste procedimento e estabelece uma relação substancial com as condições materiais (técnicas, humanas e financeiras) necessárias para o seu sucesso (Artigo 84 da Lei n.º 1/2008, de 16 de Janeiro).
(Capacitação das autarquias)
1. Compete ao Governo criar condições para a transferência de funções actualmente exercidas por qualquer dos órgãos do Estado para as autarquias locais.
2. A transferência a que se refere o número anterior deve operarse de forma gradual, e acompanhada da consolidação dos necessários requisitos de capacitação técnica, humana e financeira, dos órgãos autárquicos.
3. Cabe ao Governo regulamentar e apoiar as autarquias de forma a capacitá-las para, no prazo máximo de três anos, procederem à cobrança directa de todos os impostos autárquicos.
4. A liquidação e cobrança dos impostos é assegurada pelos serviços do Estado até estarem criadas as condições mencionadas no número anterior. (BR. Artigo 84 da Lei n.º 1/2008, de 16 de Janeiro) Pp.18.
O Decreto n.º 33/2006, de 30 de Agosto vem, paradoxalmente, posicionar as autarquias locais no centro do processo de transferência de competências porque são, elas mesmas, que devem reivindicar esta transferência nos domínios enumerados pelo referido decreto. Vê-se, por conseguinte, desenhar uma transferência de competência “à escolha”, as autarquias locais mais “agressivas” e, mais convincentes, beneficiarão de transferências de competências enquanto as que são menos reactivas ou ambiciosas beneficiarão pouco ou não de novas competências.
3.1. b) As modalidades das transferências de competências
A iniciativa da transferência de competências pertence quer, aos órgãos locais do Estado, quer, às autarquias locais (Artigo 3 do Decreto n.º 33/2006, de 30 de Agosto). Na prática, são as autarquias locais que foram o motor principal desta iniciativa. A perda ou diminuição de poderes nunca é bem vista pelos órgãos locais do Estado.
A autarquia local que solicita a transferência deve indicar as suas capacidades técnicas para assumir as competências reivindicadas. Em especial, a autarquia local deve elaborar uma proposta na qual indica as suas capacidades e as suas necessidades em termos de recursos humanos, materiais, financeiros e patrimoniais e as modalidades segundo as quais serão utilizadas. A transferência de competências é formalizada por um acordo celebrado entre o Governo Provincial e a autarquia local. Se se puder justificar a opção do “gradualismo” dizendo, por exemplo, que é inútil transferir competências que as autarquias locais não estariam em condições de implementar, em contrapartida, dois travões ferem este processo.
O primeiro é devido a inércia conjugada do Estado e das autarquias locais que teve como efeito impedir a transferência da totalidade dos domínios previstos na regulamentação vigente. Este prazo foi prorrogado de dois anos pelo Decreto n. ° 58/2009, de 8 de Outubro.
O segundo é devido a natureza do financiamento da transferência de competências que não garantia a autonomia financeira das autarquias locais. É através de dotações orçamentais anuais que será financiado o exercício das competências transferidas. Vê-se efectivamente os riscos que podem advir de tal escolha.
4. Conclusão
Fim do trabalho conclui-se que A dinâmica gradual “do poder local O modelo ideal de descentralização territorial que foi imaginada no fim dos anos 90 em Moçambique foi introduzido numa realidade “agressiva”: insuficiências de meios materiais e financeiros, exiguidade dos recursos humanos, nomeadamente, do pessoal bem formado nas novas técnicas da descentralização, infra-estruturas, a maior parte do tempo, degradadas e/ou em mau estado de funcionamento e dos eleitores na expectativa de uma mudança radical na gestão dos recursos locais109 Contudo, as autarquias locais souberam fazer face a essas dificuldades com mais ou menos sucesso110 e a imensa maioria dos cidadãos moçambicanos reconhece a sua utilidade111 . Adescentralização é, por natureza, um processo e, como qualquer processo social, o elemento temporal desenvolve um papel importante na estruturação progressiva da sua dinâmica. O processo de descentralização é ainda jovem em Moçambique e terá ainda necessidade do apoio do Estado. O Estado deve medir os efeitos da descentralização - processo que ele próprio empreendeu - e estar consciente do grande potencial criativo que este processo pode gerar.
5. Bibliografia
GILLES CISTAC, Institucionalização, organização e problemas do poder local, Lisboa, Abril de 2012.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. Constituição de 2004, 19 de Nov..doc.
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