Universidade Save - Maxixe
Curso: Licenciatura em Ensino de História
Cadeira: História Contemporânea da Europa e América Século XIX à XXI
Tema: O
Consolado
Referência Biográfica: BELO,
Filomena & OLIVEIRA, Ana. A Revolução
Francesa. Coimbra, Quimene. 2001.
Ficha
de leitura
Ideia central
A seguinte ficha de leitura debruça sobre o consulado,
onde vamos encontrar a reorganização do estado, o enquadramento da sociedade, a
guerra e a paz, o império, conflito ideológico, estado burguês, a unidade
nacional e a Revolução ecuménica. O nome de Napoleão suscita quase
invariavelmente as mais inflamadas paixões, aparecendo associado a parecendo
extremistas, de adulação ou de vitupério. Mas os seus detractores não hesitam
em lembrar a ditadura que impôs, a forma capciosa como instrumentalizou o povo,
dando-lhe a ilusão de viver em liberdade e de nele residir a vontade soberana,
quando a realidade era bem distinta. Importa pois temperar a paixão que envolve
o Imperador, separando de entre os seus actos aqueles que contribuem para o
progresso da Franca, que a dotam de instituições que perduram nos séculos
seguintes e serão exportadas por toda a Europa, dos outros que invocam as
criticas mais severas, ásperas e contundentes.
O consolado
Com Bonaparte termina a Revolução
burguesa para se instalar o regime burguês. A sua actuação vai criar os
fundamentos do moderno Estado francês. Quando o vencedor do golpe do Termidor
assume o poder, a sociedade francesa esta ávida de paz: sentem-se os efeitos do
período conturbado que assolara a Franca desde 1789. Um verdadeiro vendaval a
que nada nem ninguém ficara indiferente. Bonaparte pressente esse estado de
espírito e proclama as suas intenções de forma elo quente: «Cidadãos, a
Revolução esta consolidada nos princípios que a inspiram: agora terminou.
Napoleão promete aos seus compatriotas aquilo por que eles mais anseiam: as
grandes conquistas da Revolução mantêm-se, mas agora num clima marcado pela
paz, pela calma, pelo consenso. (BELO & OLIVEIRA:2001, 121-122)
Napoleão, que tinha comungado das aspirações
nacionalistas do seu pai ern relação á sua terra natal, a Córsega, cedo
envereda pela carreira das armas. As vitórias sucessivas cobrem-no de glória e
projectam-no para a vida política. A estratégia de Barras, Sieyes, Talleyrand,
entre outros, seria a de o usarem para eliminar os opositores personificados
nos realistas e naqueles que persistem em considerar-se herdeiros dos Jacobinos
e dos sans-culottes. Gizam, então, uma estratégia que faz dele o herói do golpe
do 18 do Brumario, mas esperam que, depois, ele continue no exterior, a frente
das campanhas, deixando-lhes o caminho livre. Napoleão depressa os desilude, e
enceta uma trajectória que lhe permite instrumentalizar em vez de ser
instrumentalizado, dominar em vez de ser dominado, controlar em vez de ser controlado,
capitalizando a auréola de vencedor em proveito próprio (idem.)
O salvador da pátria e defensor dos valores
fundamentais da revolução de 1789, não quer o retorno ao Antigo regime,
acredita no futuro da França, mais sabe se que é imperioso repor a ordem,
condição imprescindível para reorganizar a vida política, viabilizar o
progresso económico e semear as finanças.( Pág:123)
O nome de Napoleão suscita quase
invariavelmente as mais inflamadas paixões, aparecendo associado a parecendo
extremistas, de adulação ou de vitupério. Mas os seus detractores não hesitam
em lembrar a ditadura que impôs, a forma capciosa como instrumentalizou o povo,
dando-lhe a ilusão de viver em liberdade e de nele residir a vontade soberana,
quando a realidade era bem distinta. Importa pois temperar a paixão que envolve
o Imperador, separando de entre os seus actos aqueles que contribuem para o
progresso da Franca, que a dotam de instituições que perduram nos séculos
seguintes e serão exportadas por toda a Europa, dos outros que invocam as
criticas mais severas, ásperas e contundentes. (idem)
Para dar consecução ao seu programa e
cumprir o desiderato de promover o bom funcionamento do Estado no seio de uma
sociedade em paz, define três grandes prioridades: dotar a Franca de uma nova
Constituição, assegurar uma administração eficaz e solidificar o erário. Em
cerca de dois anos o essencial dos seus propósitos é alcançado (Pág :123)
A 15 de Dezembro de 1799 e proclamada
mais uma Constituição, a do Ano VIII (Anexo 3). Estabelece o Consulado em que o poder esta nas mãos do
Primeiro Cônsul, Napoleão, pois a ele compete a iniciativa das leis, a
capacidade de nomear os ministros e a responsabilidade de do orçamento, da
diplomacia e da guerra. Aos outros dois Cônsules - Cambaceres e Lebrun - restam
funções meramente honor (ficas, ou seja, Bonaparte e a autoridade de máxima (Pág:124)
No topo da hierarquia esta o Conselho
de Estado que elabora e prepara os projectos de lei. O Senado zela pela sua
constitucionalidade, o Tribunado discute as leis e o corpo legislativo vota-as.
Vale a pena sublinhar que o poder legislativo se dilui por quatro Assembleias
que se neutralizam entre si. A organização do poder judicial e mantida, mas a eleição
dos juízes e suprimida. Em suma, a Constituição do Ano via cumpria o propósito defendido pelo abade de Sieyes: «A
autoridade vem de cima e a confiança vem de baixo», neste caso concerte, a
favor de Napoleão. O poder altamente centralizado prolonga-se por uma
administração que vincula o mesmo princípio, ou seja, todas as ordens emanam do
topo. Para tal, em Fevereiro de 1800, são promulgadas as leis sobre a
administração local que criam os prefeitos. Toda a ideia de administração e de
conjunto seria destruída se cada prefeito interpretasse subjectivamente uma
lei, ou um acto do Governo. (idem)
Torna-se um simples cidadão quando, em
vez de se limitar a executar, tem ideias diferentes das do Governo e sobretudo
se as manifesta publicamente.As ideias gerais devem partir de cima, e dai que
emana a ordem, uniforme e comum a todos: constato, com pena, que alguns de vos,
por certo animados das melhores intenções, querem interpretar as leis, dirigem
-se as populações através de circulares, enchem os jornais com a descrição das
realizações que promovem. Não e deste modo que o Governo concebe a
administração. A acção policial também e reforçada, entregue ao todo poderoso
Fouche. Torna-se um instrumento de controlo e vigilância, visando prevenir
qualquer tentativa de subverter a ordem instituída. Como se conclui, um piano
desta envergadura não e exequível sem dinheiro, e Napoleão não quer um Estado
pobre, sem receitas suficientes, ao invés, deseja inverter a situação de
penúria (Pág:125-126)
Constituído com
o capital inicial de 30 milhões, tem o monopólio da emissão do papel-moeda, a
partir de 13 de Maio de 1803. Tem origem na designada Caixa de Con-
tas-Correntes, sendo Perregaux, Recamier e Desprez os seus banqueiros mais empreendedores.
E também sua a iniciativa de introduzir como unidade monetária o franco,
estável ate ao final do século XIX. Designado por franco germinal, tem o peso
de 5 gramas de prata, fixando-se a paridade em 1/15,5. O eleito destas medidas
concertadas e notável: em 1802 o orçamento da Estado está equilibrado, proeza
que nem o Antigo Regime nem a Republica tinham logrado atingir. Quanto as
actividades económicas, estimula as indústrias e o comércio, e promove o
largamento de importantes infra-estruturas: estradas, pontes, canais (Pág, 126)
O enquadramento
da sociedade
Percebe que a
reconciliação nacional passa obrigatoriamente pelo fim das dissidências
religiosas que haviam aberto uma fractura importante no seio dos Franceses,
remetendo-os para dois campos opostos: a França católica e a França
revolucionaria. O conflito remonta aos alvores de 1789, e tivera o seu ponto
culminante com a Constituição Civil do Clero. Assumindo-me católico pus termo a
guerra da Vendeia, fazendo-me muçulmano estabeleci-me no Egipto, e ao tornar-me
ultramontano ganhei a Itália (Pág:127)
Nas escolas e introduzido um novo
catecismo, o catecismo imperial, com uma estrutura semelhante ao catecismo
cristão e organizado era perguntas e respostas. Ensina as crianças os
principais deveres para com os seus governantes e, em especial, para com
Napoleão I: os cristãos devem aos príncipes que os governam, e nos devemos em
particular a Napoleão, nosso imperador, o amor, o respeito, a obediência, a
fidelidade, o serviço militar, os tributos ordenados para a conservação e
defesa do Império e do seu trono; devemos-lhe ainda orações fervorosas para a
sua salvação e para a prosperidade espiritual e temporal do Estado. Uma das
realizações maiores de Napoleão: o Código Civil. (Pág: 128)
O período pós-revolucionário contribuiu
para agravar a anarquia no seio do sistema jurídico que ia sendo ajustado a
medida das circunstâncias, mas sem que tivesse um elo lógico e unificador.
Certas matérias merecem agora um consenso mais alargado, como, por exemplo, a
secularização do Estado. O Primeiro Cônsul consegue chegar a um equilíbrio em
que o ponto mais forte resulta das sínteses hábeis Tradição/Revolução, Direito
Romano/Direito Revolucionário, preservando, em simultâneo, o essencial das
conquistas revolucionárias que o Estado solenemente se compromete a respeitar,
O Código Civil, promulgado a 21 de Março de 1804, refine 36 leis, votadas entre
1801 e 1803, compiladas em 2281 artigos. Destacou-se dois dos aspectos mais
relevantes nesta área. (idem)
A família legitima sai reforçada, uma
vez que a autoridade do pai como chefe e revigorada, aos filhos naturais não
são reconhecidos quaisquer direitos, e se o divorcio não e abolido, a verdade e
que agora e muito mais difícil de obter. Quanto a liberdade do trabalho, ela e
considerada como um direito, mas as disposições introduzidas favorecem o
empregador face ao empregado. A obrigatoriedade de os trabalhadores possuir uma
caderneta e uma das provas mais concludentes. Algumas ilações podem ser'
retiradas: o Estado e o grande beneficiado desta legislação, ao definir os
limites impostos aos cidadãos e ao assumir-se como o maior garante dos bons
costumes e da ordem social. A legislação napoleónica - Código Civil, Código
Penal e Código Comercial - marca quase toda a Europa ate aos nossos dias.
Napoleão tem plena consciência do alcance do documento que ficara para sempre
associado ao seu nome. Napoleão não descura um outro segmento dominante te da sociedade
francesa e promove o enquadramento social da juventude. Surgem as universidades
imperiais e os liceus, onde e adoptada uma disciplina militar, com uniformes e
toques de tambor, e prevalecem currículos com forte pendor clássico (Pág.:
129-130.)
Depois da sua
derrota em Abukir (1 de Agosto de 1798) que evidencia a supremacia naval da
Inglaterra, Napoleão e confrontado com uma segunda coligação que integra, para
alem da sua arqui-rival, os Austríacos e os Russos (idem).
. Depois de uma campanha meteórica em
Itália (Abril de 1796 a Abril de 1797), o Imperador da Áustria e constrangido a
assinar a paz em Campoformio (Outubro de 1797).
Os Austríacos, perante o fracasso da coligação, renovam em Luneville o
tratado de Campoformio. Os Ingleses estão sozinhos e chega também a sua vez de
admitir a superioridade francesa: negoceiam a paz, firmada pelo Tratado de
Amiens, em 25 de Margo de 1802. A paz volta ao Continente, facto
verdadeiramente assinalável, se nos lembrarmos que a guerra começara em 1792,( Pág:130).
O Império
Napoleão e credor de um imenso
prestigio que as suas conquistas só contribuíam para aumentar, mas sente que
cada vitória pode ser a ultima, e ambiciona por um poder ainda maior que não o
deixe refém de nada nem de ninguém. Dois argumentos vão funcionar a favor das
suas pretensões: a ameaça do recomeço de uma guerra com a Europa e as
investidas monárquicas que deixam pairar o perigo do retorno ao Antigo Regime (Pág:,
131-132).
Para respeitarmos a verdade, impõe-se
uma rectificação: não e Pio VII, mas
sim Napoleão que se sagra a si próprio. Em seguida, repete o gesto, desta vez
na sua mulher, a Imperatriz Josefina.
Uma nova modalidade para a consulta da
vontade popular cauciona a eleição nestes cargos: o plebiscito. A 10 de Maio de
1802, o Primeiro Cônsul, ao recolher 3 500 000 sins contra 8374 nãos, torna-se
Cônsul vitalício. Em 1804 ascende a Imperador hereditário com 3 572 000 votos
favoráveis e 2579 contrários. Napoleão acaba de criar um novo modelo político,
o cesarismo plebiscitários: a autoridade reveste-se de uma feição ditatorial
sendo, porem, legitimada pela vontade popular (Pág:, 133).
Bonaparte trouxe a estabilidade a uma
nação marcada por vinte e cinco anos de turbulência. Apazigua as tensões
religiosas diluindo o fosso criado entre os católicos e a revolução, põe em
funcionamento uma máquina administrativa ate aí anárquica, reorganiza o
aparelho de Estado, relança o comércio e gera as condições propícias a
confiança dos agentes económicos.A burguesia, um dos esteios mais fortes em que
Napoleão sustenta o seu poder, sente-se segura e confiante. As diferenças
salariais são acentuadas; tomemos como exemplo os prefeitos e os amanuenses de
segunda classe: em 1810, os primeiros auferem um vencimento de cerca de 50 000
francos por ano, enquanto os segundos recebem 1200 francos. (idem)
Napoleão introduz outras marcas de distinção
social. A partir do momento em que ascende a «alteza sereníssima» cria uma nova
nobreza, concedendo esse estatuto aos seus familiares, aos altos dignitários do
Estado e a outro dos pilares do regime: os generais e os marechais, agraciados
com inúmeras honrarias.
Os camponeses e
os operários também exprimem a sua adesão. Os primeiros conquistaram uma das
suas principais reivindicações: a supressão definitiva dos direitos feudais e,
doravante, o acesso a propriedade não e uma impossibilidade. Acresce que os
impostos não sobrecarregam em demasia o mundo rural. Outras modificações são
introduzidas. Napoleão rodeia-se de uma «corte» em que o fausto e a pompa quase
fazem evocar os tempos anteriores as grandes convulsões revolucionárias (Pág:133-134).
As senhoras dão
o toque de sofisticação, concorrendo entre si pela elegância e ate por uma nova
forma de trajar. A moda Império testemunha os novos tempos. Surge especialmente
associado ao mobiliário, a ourivesaria, a porcelana e á decoração, e difunde-se
pela Europa e pela América do Norte (Pág :135).
No domínio da pintura, David
(1748-1825), um antigo jacobino, republicano confesso, deputado da Convenção
que integrara o grupo dos que votaram a favor da condenação á morte de Luis
XVI, e que ainda passa brevemente pela prisão após a queda de Robespierre
(1794), vai render-se ao Imperador. Torna-se o pintor oficial da Corte (idem)
Para culminar, as vitórias tem um
protagonista indiscutível e mobilizam os Franceses em torno de um Imperador
que os faz sentir parte de um povo de eleição. Enquanto esta situação se
mantém, Napoleão Bonaparte e o líder incontestado. Em relação a este ultimo,
enfatizemos três características que fazem dele uma máquina de guerra altamente
eficaz: o volume dos contingentes, a experiencia e o ideal. O elevado numero
dos que integram as formas armadas resulta primeiro da mobilização maciça que,
durante a Convenção, havia recrutado 300 000 soldados, mas também tem a sua
origem no aumento demográfico vivido nesse século (Pág:136).
Napoleão, um
estratego com invulgares dotes militares, não só incentiva os seus homens a
superarem-se a si próprios, como a emularem-se no campo de batalha. As
demonstrações de valentia são inúmeras: a divisão de Massena percorre cem
quilómetros a pé em apenas três dias e consegue três vitórias. Outro trunfo favorece o exército: a
juventude. Napoleão e feito general com 24 anos, Murat e responsável por uma
brigada com 26 anos, Ney com 27 anos, ou seja, o comando este confiado a um
grupo de homens cujas idades oscilam entre os 26 e os 37 anos. Mas este
exército padece de algumas franquezas. O
artífice de todos os pianos e sempre Napoleao, e, se o valor dos seus
subordinados rnais directos e inquestionável, a maioria não tem capacidade de
iniciativa: limita-se a executar ordens, ou seja, tudo depende do Líder. Outro
ponto vulnerável decorre da existência de muitos soldados estrangeiros,
recrutados nas zonas conquistadas, sendo a sua fidelidade duvidosa,
especialmente quando os desaires ocorrem (Pág:137).
O exército
torna-se um dos meios de ascensão social, e não admira que os generais do
Império sejam quase todos oriundos da média burguesia parisiense. Em oito anos,
de 1804 a 1812, Bonaparte conquista a Europa: as suas tropas dominam desde
Portugal a Moscovo, passando por Roma e Hamburgo. Numa Europa com 167 milhões
de habitantes, o Império controla 44 milhões e o «Grande império» 82. Em 1805,
a grande vencida é a Áustria, em 1806-1807 a Prússia e a Rússia. Em 1809, a
Áustria e obrigada a reconhecer uma nova derrota. Na Alemanha, os territórios
do Saxe, Vestefalia, Hanover dilatam-se a custa da Prússia e da Áustria.
Napoleão torna-se rei de Itália, anexa os Estados Pontifícios e domina o reino
de Napoles. O seu irmão e o novo rei de Espanha, e em Varsóvia é construído um
grão-ducado. As províncias da Ilíria passam a integrar o território francês, e
o Império, com mais de 130 Departamentos, estende-se pela Bélgica, Renânia,
Holanda, (Pág :138)
Alianças e política matrimonial
conjugam-se com a acção militar: em 1810 Napoleão casa-se com Maria Luísa,
filha do Imperador da Áustria e sobrinha de Maria Antonieta, passando a fazer
parte das famílias reinantes europeias. Estes sucessos são ilusórios, porque o
maior obstáculo, a Inglaterra, não fora removido. Pós com a revolução
industrial, um processo de transformação que mudaria a face da terra. Nesse sentido, decreta, em 21 de Novembro
de 1806, o Bloqueio Continental, que tern um duplo objectivo: remeter a
Inglaterra ao espaço restrito das suas ilhas, impedindo-lhe o acesso a bens
indispensáveis como os cereais ou a madeira, e lesar os seus interesses
económicos, pois, ao fechar os portos europeus as mercadorias britânicas, as
exportações diminuíam e a balança comercial seria gravemente afectada (Pág: 139).
A proibição de realizar trocas
comerciais não e pro- priamente uma novidade; lembremos que o mercantilismo, ao
adoptar o proteccionismo, desencadeara um processo semelhante. A grande
inovação e que, pela primeira vez, um decreto é imposto a escala continental,
mas aí reside também o seu ponto nevrálgico que vira a revelar-se fatal para
uma estratégia tão ambiciosa. Várias razões explicam o fracasso do Bloqueio
Continental:
ü Primeiro pode-se sublinhar que a Inglaterra e a rainha
incontestada dos mares o que, na prática, torna quase impossível vigiar e
obstruir os movimentos das suas frotas. Gramas a um dinamismo em crescendo, as
suas actividades produtivas são reforçadas, e consegue mesmo expandir-se em
zonas onde anteriormente não actuava, como o Mediterrâneo e a América Latina;
ü Doravante, a Franga tem de substituir a sua velha rival,
tornando-se a grande fornecedora do Continente. Acontece que a economia
gaulesa, apesar de evidenciar muitos progressos, não lograra ainda recuperar o
atraso resultante do período conturbado que vivera desde 1789;
ü Adiante-se um outro problema. Os sistemas demasiadamente
restritivos geram sempre efeitos perversos, e o mais comum e assistir-se ao
aumento do contrabando, dificilmente controlado pelas alfândegas e pelas forças
da ordem;
ü Acresce que a colaborarão dos países sob controlo francês é
uma peça-chave para o sucesso deste projecto; porem, a propaganda inglesa
contra o «vampiro sedento de sangue fresco» que engana os povos conquistados,
porque, em vez de lhes proporcionar a tão apregoada liberdade, os submete,
começa a dar os seus frutos,( Pág: 139-140).
A lista dos obstáculos não termina,
para que o domínio continental seja efectivo não pode haver brechas, e os
exércitos franceses necessitam não só de contingentes constantemente reforçados
e renovados, mas também de muito dinheiro para garantir que todas as nações
acatem as cláusulas do Bloqueio, condição imperiosa para o seu sucesso.
Napoleão vai, contudo, encontrar opositores inesperados que o obrigam a
dispersar-se em várias frentes, desgastando as suas formas;
A Península Ibérica o Imperador envia
os seus generais, convencido de que não encontraria qualquer resistência, mas a
realidade e bem distinta, porque os militares são recebidos em Espanha por uma
população sublevada que se lança numa guerrilha devastadora para as tropas
invasoras;
O czar
Alexandre I, de inicio cooperante, cedo de monstra algumas reticências, o que
obriga Napoleão a lançar-se na terrível campanha da Rússia. Bem se pode
afirmar, utilizando uma expressão popular, que o feitiço se virou contra o
feiticeiro. No seio da sociedade francesa o mal-estar também começa a
instalar-se. O modelo político introduzido por Napoleão, altamente centralizado,
fá-lo concentrar em si todos os poderes, mas aí reside uma das suas maiores
debilidades. A personalização, a omnipresença geram uma relação perversa: a sua
ausência quase paralisa as instituições, deixando tudo em suspenso. (Pág:
141-142)
A conjuntura criada pelo Bloqueio Continental
acaba por funcionar em sentido inverso ao esperado, e depressa se sentem os
seus efeitos: o abastecimento é afectado, os pregos sobem, os impostos
indirectos crescem o que gera uma onda de descontentamento geral. Os mineiros
também engrossam o núcleo dos insatisfeitos: desencadeiam um protesto laboral
que, para além de prejudicar o bom funcionamento das forcas armadas, é mais um
sinal do clima explosivo e do recrudescimento das tensões sociais. Pressionado
pela necessidade de aniquilar o comércio inglês com a Itália, Napoleão
confisca, em 1809, os Estados Pontifícios. O reacender do conflito aviva uma
ferida ainda não sanada, e o Papa, como represália, recusa a investidura dos
bispos e sentencia a excomunhão do Imperador. (idem)
Registou o teor de uma carta que dirige
ao príncipe Borghese, general dos Departamentos de além -Alpes: «Querendo
proteger os meus súbditos do desrespeito e do furor desse ancião ignorante e arbitrário
[Pio VII] ordeno-vos, pela presente, que o notifiqueis de que lhe proíbo que
comunique com qualquer igreja ou com qualquer dos meus súbditos, sob pena de desobediência
de uns e outros.» Em 1812, em Caem, registam-se levantamentos e, para extirpar
a hidra conspiratória, adoptam-se medidas drásticas, exemplares e dissuasórias:
os cabecilhas são fuzilados. A trama adensa-se, e o general Malet apresenta-se
a 23 de Outubro de 1812, junto da Guarda Nacional, exibindo um decreto forjado
no qual se anuncia a morte do Imperador, ao mesmo tempo que se proclama como o
novo comandante militar de Paris. Em
seguida, com homens armados a sua disposição, dirige-se a prisão para libertar
uma serie de adversários do regime. Este episódio rocambolesco só merece uma
interpretação: o poder está apodrecido e pronto a ser tornado de assalto por
qualquer arrivista mais ousado. Napoleão começara por despertar nos povos um
fervoroso sentimento de nacionalismo que doravante andara muito associado a
liberalismo. O derrube do Antigo Regime ern França constitui um poderoso estimula
para todos aqueles que se sentem oprimidos e o slogan «Liberdade, Igualdade, Fraternidade» propaga-se com uma
velocidade alucinante. O rastilho estava aceso e dificilmente iria ser apagado.
Porem, a medida que os exércitos napoleónicos prosseguem as conquistas, o sonho
transforma-se em pesadelo. Os recém-conquistados aspiram a autonomia, a plena
assunção da sua soberania, e assim se justifica que se unam para combater uma
nova forma de subjugação. A derrocada do Grande Exercito, depois da campanha da
Rússia, da o sinal para a sublevação contra o imperialismo francês,
personificado, afinal, por Napoleão. Os soldados, na sua maioria, continuam ao
lado do seu chefe, mas o mesmo não e valido para os generais que começam a
demarcar-se, tentando salvaguardar as suas posições futuras. (Pág: 143-144.)
O povo mostra-se, contudo, confiante e
pronto a apoiar Napoleão, mas ele rejeita ser o «Imperador da jac- querie». Os notáveis, pelo contrário, não estão dispostos a
sustentar por mais tempo o «novo César» e preferem encarregar os inimigos do
general de dar seguimento a obra que ele tinha concretizado. A 6 de Abril de
1814, Napoleão e obrigado a abdicar, sem ter conseguido assegurar a transmissão
do poder ao seu filho, e parte para a ilha de Elba. Os termos do acto de
abdicação são os seguintes: Tendo as potências afirmado que o Imperador
Napoleão e o único obstáculo ao restabelecimento da paz na Europa, o Imperador Napoleão,
fiel ao seu juramento, declara renunciar, por ele e por seu filho, aos tronos
de França e de Itália e acrescenta que não há nenhum sacrifício, incluindo o da
sua própria vida, que não esteja disposto a fazer pelo interesse da Franca (Pág:
144-145.)
Após o seu
afastamento, os Bombons recuperam o trono, e emerge de novo o espectro do
retorno ao Antigo Regime. Napoleão ensaia a ultima tentativa para inverter o
curso dos acontecimentos: volta a Paris em Março de 1815 e tenta repor o regime
imperial, mas dotando-o de um cariz mais liberal, atraves do Acto Adicional as
Constituições do Império (1 de Junho de 1815), redigido por Benjamin Constant.
Luís XVIII refugia-se, prudentemente, em Gand. (Idem).
Esse período,
denominado pelo «voo da águia», traduz-se num Governo de cem dias (de 20 de
Março a 22 de Junho de 1815) em que o general, em vez de aproveitar o apoio
popular - provavelmente temendo excessos revolucionários -, vai confiar num
grupo de notáveis que, no fundo, acaba por o trair. O último acto desta epopeia
desenrola-se na Bélgica. O regresso do herói mobiliza a Inglaterra, que se alia
a Prússia, e em Waterloo vão confrontar-se: dum lado, Napoleão com 74 000
homens, do outro, Wellington com 100 000 e Blucher com 135 000. Nem mesmo a
valentia e o denodo podem opor-se a uma tão manifesta desproporção de forças (Pág:
145-146).
Conflito ideológico
Tal como a
sociedade, a vida intelectual sofre intensa mente os acontecimentos
revolucionários, surgindo a Revolução como o corolário do século das Luzes e do
racionalismo, como reconhece a Convenção ao homenagear Descartes, admitindo-o
por decreto de 2 de Outubro de 1793 no Panteão: ’’René Descartes merece as
honras devidas aos grandes homens.’’ A própria língua sofre uma profunda
transformação, e algumas palavras ate há pouco inócuas, como nação, pátria ou
lei, adquirem um poder desconhecido, carregado de emoção e sentimento de
empatia, enquanto outras, como aristocracia e tirania, corporizam todo o rancor
e o ódio acumulados ao longo de décadas (Pág:152).
O jornalismo
político tomou aliás uma extensão considerável desde que a liberdade de
imprensa foi decretada em 1789, apesar das restrições que, de facto, se
estabeleceram a partir de 1792. Ao teatro e também insuflada uma vida nova logo
que em 1791 (13 de Janeiro) são abolidos os privilégios em matéria teatral e
qualquer cidadão pode portanto construir um teatro público e fazer representar
as peças da sua preferência. Todos os outros, os teatros onde fossem
representadas peças que eventualmente pudessem depravar o espírito público, ou
despertar nele a nostalgia da monarquia, seriam obviamente encerrados. A
pintura e a musica são também artes ao serviço da Revolução, dando forma ao
esplendor que e exigido nas festas nacionais, onde e exaltado o entusiasmo de todo
o povo que, como actor, nelas participa (Pág:153).
Estado burguês
A organização jurídica do Estado do
Antigo Regime ruiu logo na noite de 4 de Agosto de 1789, quando todos os súbditos
do rei foram declarados cidadãos iguais, sem distinção de nascimento. Existias
algumas diferenças, pós essas diferenças não reside na nomenclatura, pois estas
duas palavras condensam em si toda a concepção do homem, tanto em termos
individuais como na forma como integram o colectivo. O súbdito e um sujeito que
se supõe por natureza passivo relativamente a um poder superior que representa
a divindade e portanto e considerado infalível.
Em consequência desta igualdade dos
cidadãos, todos os privilégios particulares atribuídos a povoações, cidades,
cantões, regiões, principados ou províncias deixam de ter sentido e são
definitivamente abolidos. A venalidade de dos cargos e suprimida, tal como são
dispensadas as fungões dos Parlamentos e dos Conselhos Superiores (Pág:155).
O Governo
Revolucionário sente necessidade de alterar esta situação e institui a
permanência das administrações ao substituir a eleição pela nomeação, embora
utilizando o argumento da depuração. O aparelho burocrático sai reforçado sobretudo
depois da criação dos agentes nacionais, obrigados a apresentar relatórios aos comités
do Governo com uma frequência quase semanal. O aparelho administrativo fica
assim estabilizado, reforçando a sua eficácia ao serviço do Estado autoritário
(Pág:156).
Os mesmos
princípios electivos e de mobilidade dos cargos presidem também á reorganização
das instituições judiciarias, mas a duração de seis anos atribuída aos mandates
e a possibilidade de reeleito minimizam os efeitos negativos e salvaguardam a
estabilidade da magistratura durante a monarquia constitucional (idem).
Unificar e
concentrar os diferentes poderes ao governo revolucionário iria garantir a
criação de um direito nacional uniforme e uma tarefa complexa mas urgente, uma
vez que a Revolução destrói os dois pilares que sustentavam a sociedade de
Antigo Regime: o direito feudal e o direito canónico. A ânsia de estabilização
sentida pelos cidadãos vai permitir ao Consulado restaurar progressivamente o
Ministério Publico através da nomeação dos juízes, reforçando também deste modo
os seus poderes (Pág:157).
Esta torna-se,
desde o inicio do processo revolucionário, uma palavra-chave capaz de libertar
forças latentes e elevar os homens acima de si próprios, mas funciona também
como a mascara sob a qual se esconde a contradição fundamental da nova
sociedade saída da Revolução: construída com base na propriedade e no regime
censitário, exclui de facto as massas populares.com tudo a unidade nacional
progride através das novas instituições administrativas que formam o quadro de
um Estado economicamente unificado pela destruição das autonomias, dos
particularismos, das alfândegas internas, mas também pela uniformização dos
pesos e rnedidas (Pág:158).
Ao nacionalizar
a guerra, a Convenção sente necessidade de impor uma só língua para consolidar
e unificar a Nação. Ao contrario da Assembleia Constituinte, que mandava
traduzir os seus decretos nos diferentes dialectos, preocupada que estava com a
autonomia, a Convenção promove através dos clubes e das sociedades populares o
francês, fazendo passar a mensagem de que o seu uso e prova de patriotismo. A
realidade e no entanto bem mais difícil de moldar do que os discursos fazem
supor, e, destituindo o latim, o francês só se impôs nas escolas centrais e nas
universidades, mantendo portanto a discriminação social (Pág:158-159).
A assistência e
uma das áreas indispensáveis para atenuar a desigualdade das condições de vida
e para caminhar no sentido da igualdade de direitos. Após a sua laicização e o
Estado que assume a responsabilidade pelas instituições já existentes e,
conforme reconhece o título primeiro da Constituição de 1791, prevê a criação
de um estabelecimento geral de socorros públicos, para educar as crianças
abandonadas, aliviar os pobres enfermos e fornecer trabalho aos pobres válidos
que não podiam procura-lo (pág. 160).
A igualdade e
bandeira quando se trata de atacar o privilégio da aristocracia, mas em relação
ao povo ela situa-se apenas no piano teórico. Estava fora de questão a
democracia social, e mesmo a democracia politica foi rejeitada, circunscrevendo-se
a Nação legal á burguesia censitária até 10 de Agosto de 1792, quando, pelo
sufrágio universal e pelo armamento dos cidadãos passivos, o povo e integrado
na Nação. Porem, uma vez que a Constituição do Ano 1 nunca entrara em vigor, a
universalidade do sufrágio não passara de letra morta (pág. 161).
Uma Revolução ecuménica
No piano
externo, a Revolução social de massas ocorrida no Estado mais poderoso da
Europa teve muitas e duradouras repercussões. A sua influência directa
extravasou completamente das fronteiras europeias, e tanto esteve na origem das
revoltas liberais que a partir de 1808 abalaram toda a América Latina, como na
fundação do primeiro movimento hindu. (pág. 164).
No ideário da
Revolução estão contidas as raízes do liberalismo, que se funda nas noções de
contrato e de direito natural propostos pelo Século das Luzes (Locke,
Montesquieu). Ainda hoje o regime liberal se mantém em discussão e tern como
objectivos principais:
A liberdade
pessoal e a liberdade de opinião e de expressão: igualdade de direitos, mas não
igualdade de bens nem de instrução;
ü A limitação do poder do Estado através de uma Constituição e
da separação dos poderes: o Estado tern como função proteger os cidadãos e
renuncia a todo o abuso de poder;
ü A participação politica do cidadão pela eleição de
representantes para um Parlamento que decide sobre as íeis e controla o
Governo;
ü A liberdade económica, entendida como oposição a intervenção
do Estado;
ü A separação entre a Igreja e o Estado e a progressiva laicização
da sociedade.
ü O liberalismo e sustentado pela parcela esclarecida da
burguesia que salvaguarda o seu poder através da instituição do voto censitário
(pág. 164-165).
Conclusão
Durante a
leitura percebeu se que : . O poder altamente centralizado prolonga-se por uma
administração que vincula o mesmo princípio, ou seja, todas as ordens emanam do
topo. Os mesmos princípios electivos e
de mobilidade dos cargos presidem também á reorganização das instituições
judiciarias, mas a duração de seis anos atribuída aos mandates e a
possibilidade de reeleito minimizam os efeitos negativos e salvaguardam a
estabilidade da magistratura durante a monarquia constitucional. Unificar e
concentrar os diferentes poderes ao governo revolucionário iria garantir a
criação de um direito nacional uniforme e uma tarefa complexa mas urgente, uma
vez que a Revolução destrói os dois pilares que sustentavam a sociedade de
Antigo Regime: o direito feudal e o direito canónico. A ânsia de estabilização
sentida pelos cidadãos vai permitir ao Consulado restaurar progressivamente o
Ministério Publico através da nomeação dos juízes, reforçando também deste modo
os seus poderes. A igualdade e bandeira quando se trata de atacar o privilégio
da aristocracia, mas em relação ao povo ela situa-se apenas no piano teórico.
Estava fora de questão a democracia social, e mesmo a democracia politica foi
rejeitada, circunscrevendo-se a Nação legal á burguesia censitária até 10 de
Agosto de 1792, quando, pelo sufrágio universal e pelo armamento dos cidadãos
passivos, o povo e integrado na Nação.
0 comentários:
Enviar um comentário